“Tem calma querido, não chores. Olha para mim, não olhes para o braço porque assim dói mais”.
Foi a minha primeira abordagem ao menino de olhar perdido…
Qualquer ala de hospital, transporta-nos inevitavelmente para episódios menos agradáveis… e hoje tive um desses episódios que me deixou de coração apertado.
Os bebés choram sem pensar, simplesmente choram porque têm dores ou fome ou qualquer coisa do género, mas os meninos grandes, os meninos já homens não choram (ou pelo menos à frente de todos sem pensar duas vezes).
Mas ele chorava, e chorava tanto.
Agonizava e contorcia-se de dores. Não consegui, nem quis fingir que não me estava a cortar o coração.
Tentei resistir, mas as lágrimas começaram-me a correr e o coração a bater desenfreadamente e tive que ir até ele e tocar lhe.
Tentei resistir, porque nestes momentos muito sensíveis, nunca sei bem se estou a fazer o bem, ou se a pessoa quer é ficar sozinha sem ter que me aturar.
Procurei uma zona do braço, onde estivesse longe dos cateteres que tanta dor lhe causaram a colocar, e toquei-lhe, dei-lhe festinhas e pedi-lhe por favor para ter calma.
“Tem calma, querido, respira fundo, tem calma”.
Comecei a respirar e a pedir-lhe para acompanhar o meu ritmo.
Perguntei ao enfermeiro se o estavam a medicar, voltei para junto dele e prometi-lhe que daqui nada, as dores iam passar e ele ia ter um pouco de paz.
Aqueles segundos pareciam horas, e eu sem poder fazer nada… não consigo passar por estas coisas, sem me sentir impotente…
Pedi-lhe para que me falasse dele, e ele que já está habituado a essas perguntas, começou logo a debitar o seu historial clínico e eu disse lhe que preferia saber o que ele fazia, onde morava.. essas coisas mais importantes. A vida dele e não a doença dele.
“Trabalho na PT”. E eu pensei: É agora! Abriu-me uma nesga para invadir o mundo dele!
“Olha eu ando muito zangada com a PT” e comecei a contar todos os desatinos que tenho tido com a PT, e entretanto ele já respirava melhor, e até começou a tentar ajudar me com os problemas técnicos, e eu pensava (Yessss! Estou a conseguir que ele se afaste da dor por uns momentos). Rapidamente contou-me onde morava e o que gostava de fazer.
O enfermeiro volta para ver como ele estava e encontra-o já com outra cara e diz-lhe: “Ah, comigo só choravas e agora já convesas e tudo“!
E ele abre um sorriso, daqueles marotos com covinhas e tudo. Fiquei tão feliz. Missão cumprida!
E os olhos aos poucos ia perdendo o rasto de dor e as lágrimas iam secando… Tão querido e humilde.
No fundo da sala, num silêncio profundo estava a Mãe… assistiu a tudo em silêncio. Assistiu ao filho a gritar de dores e ela vazia e sem qualquer expressão, olhava fixamente para ele…
Eu olhava para ela e não entendia bem, se ela me queria por perto ou não. Já tinha conquistado o menino, mas a mãe ainda não tinha baixado as armas, afinal eu estava perto da cria dela.
Perguntei lhe se queria um chocolate para lhe dar energia, que iria ao café comprar para ele, disse-me que não tinha apetite, não insisti… percebi que tinha grandes dificuldades para respirar e comer.
E ele dizia: “Mas agradeço muito”.
Um Homenzinho tão querido.
Então disse lhe que já voltava.
Voltei.
Olhei para ele e fiquei descansada e com sentimento de paz.
Ele dormia, no mesmo local onde tinha estado a chorar tanto.
Dormia como se fosse um bebé e não um homem já feito.
E desta vez, não resisti e fui dar uma festinha à Mãe e deixar um beijinho muito grande no coração do filho e dela.
Ela sorriu. Com a voz embargada, agradeceu-me com aqueles olhos, que só uma Mãe sabe fazer, quando sente que alguém se preocupou com o filho.
Não sei o teu nome. Mas sei de que cidade és e onde trabalhas.
E chega, porque na verdade, eu só precisei mesmo de saber que já estavas sem dores.
Ver-te a dormir, deu-me uma paz inacreditável. I’m feeling white.
As melhoras, menino grande.
Até qualquer dia.
Não sei se consigo fazer um top 3 dos I’m Feelings, mas este deixa-me com a sensação de murro no estômago..
Obrigada por leres e gostares dos meus I’m Feelings, são escritos com o coração na ponta dos dedos.
Bjs
Obrigado pela partilha e também pela prova de humanidade. Ainda estou com aquela vontade de rebentar a chorar…
Obrigada eu Rosa por ler o que escrevo…
Penso tantas vezes neste menino… nunca mais o vi…
Beijinhos